Thursday, March 02, 2006

Tempo




Pronto, vamos lá.
Novamente estou aqui, depois de tanto tempo, tantas coisas que aconteceram por aí afora e por aqui dentro também.
Pra começo de conversa, me mudei de casa. Conseqüência de outro fato extraordinário que se passou comigo: concluí a faculdade. Até semana passada era formanda mas, depois de algumas horas vestida de beca, morrendo de calor, fazendo discurso (sim, fui a oradora da turma) e poses para os fotógrafos, me tornei uma formada. Uma profissional do marketing ou marketeira, como alguns preferem. Eu não. Não que isso tenha revolucionado minha vida profissional, que eu tenha recebido um aumento de salário, novo emprego ou férias em algum lugar afrodisíaco, mas o fato de deitar a cabeça no travesseiro e pensar: Eu consegui! Eu agüentei! Eu fui paciente e investi numa estória de conclusão em longo prazo, realmente me fez bem. Já comecei tantas coisas, já tentei tantas possibilidades pra esse serzinho que habita em mim que até perdi a conta. Raríssimas vezes consegui concluir alguma delas. Talvez preguiça, ou simples perda de tesão. Porque eu perco o tesão nas coisas mesmo.
Mas dessa vez foi diferente, segui em frente, agüentei professor chato, português errado e pão de queijo todo dia na cantina. Agüentei ponto de ônibus na chuva (com trânsito, é claro), agüentei mensalidades, banheiro sujo e poucas horas de sono. Tudo isso, na verdade, foi abstraído por mim. Eu cantava lá lá lá quando algum desses fatos rolava porque o saldo era positivo. Como um casamento: tem lá suas chatices mas, enquanto dá vontade de sorrir, vamos em frente. É uma delícia viver estórias.
O saldo era positivo porque fiz amizades, vivi um romance (que durou menos do que o curso, mas teve seu valor), tive professores ótimos, matei aula de sexta-feira, essas coisas. Uma fase que não volta mais, definitivamente. Eu, que me sinto com 17 anos, não poderia ter passado minha pseudo adolescência de forma melhor. Foi ótimo.
E acabou. E com ela acabou o sentido de morar em Guarulhos, simples assim. E por isso, voltando ao primeiro assunto desse texto, me mudei.
Poderia vir com aquele papo de que sou andarilha, nômade, inconstante... mas a verdade é que sou prática. Chega de enfeitar o bolo. Trabalho em Mairiporã e me mudei pra Mairiporã. Faz sentido, né? Prezo por algumas horas a mais de sono.
E aqui tenho amigos, tem montanhas verdes, tem ar puro e família. Aqui tem silêncio também.
Aluguei uma casinha caindo aos pedaços. Lixei, pintei, limpei, fiquei com dor nas costas, mas valeu a pena. Agora ela parece uma casinha de campo, com paredes brancas e batentes e portas azuis. Ganhei de presente a Harolda de Tróia, uma gata que anda na diagonal. Que não tenho coragem de deixar na lavanderia e, por isso, dorme comigo e toma conta da cama toda. E fico encolhida no cantinho, torta e sem dormir, só pra não acorda-la. Ela é um bebê, está em fase de crescimento, precisa de amor e carinho... compreensível.
Na primeira semana fiz festinhas de inauguração. Na segunda semana convidei amigos pra jantar e a casa ficou uma zona. Agora, na terceira, tudo está brilhando, arrumadinho... chego em casa e?
Olho para as paredes. Perambulo sem saber o que fazer.
Cheguei ao absurdo de pensar que preciso de uma tv. Pra ver a que ponto chega o deslocamento de não se saber mais como é que se faz pra ficar consigo mesmo.
Faz tempo, muito tempo, que não tenho esse tempo.
Agora penso no tempo.
Antes era aquela correria, chegava em casa às 23h, acordava às 5h e hoje percebo que todas as vezes que me olhei no espelho pra arrumar meu cabelo, com pressa, não me enxergava de verdade.
Agora tenho tempo pra me enxergar. Tenho tempo pra pensar o que vou fazer com esse tempo livre. Por isso sentei pra escrever (desisti da idéia da tv, graças a Deus) e me lembrei de quanto tempo faz que não escrevo. Há quanto tempo não tinha tempo pra escrever? Agora o tempo é algo novo, um leque de novas possibilidades. Agora tenho que pensar em mim e o que vou fazer por mim enquanto não estiver no trabalho. Não vou pensar em trabalho.
Me bateu solidão também. Mandei mensagens para as amigas, telefonei. Mas não posso gastar tanto com celular e, na verdade, não posso ficar assim gastando meu tempo fugindo de mim. Não é pra isso que ele está em casa agora. O tempo habita minha casa. Ele paira pelos cômodos.
Ginástica? Fazer um jantar pra mim?
Tentei fazer caminhada e quando abri a porta, estava chovendo.
Lavei alface e comi a feijoada que minha amiga trouxe numa marmita. Só tive que esquentar no microondas: 50 segundos.
Brinquei com a Tróia, coloquei cds nos 3 compartimentos do meu som e eis que, Fiat Lux!, lembrei que escrevo, que tenho cerveja na geladeira e cigarros no maço!
E cá estou. Brincando novamente com o tempo, fazendo dele meu companheiro de noites chuvosas.
Tomara que esses tempos durem bastante pois há que se aprender muito com o tempo. Esse cara é realmente um mistério mas, pelo visto, vou deixar de ser um mistério pra mim, já que vou ter tempo suficiente pra me olhar direito no espelho.


30/01/06 21:25

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