Wednesday, December 27, 2006

Primeira pessoa

É preciso coragem e desprendimento pra escrever em primeira pessoa.
E humildade pra admitir que tudo (ou quase) o que se escreveu foi um grande engano.
É preciso uma boa dose de ousadia para iniciar novos versos.
É preciso delicadeza pra se acariciar
E olhos vivos pra enxergar
E perceber com clareza
A morte
Que anuncia a chegada de um novo ser
Que, no entanto, sempre esteve ali.





22/12/2006

Noite de verão II

Gosto da música em meus ouvidos. Misturados a um delicado som de violão, ouço os grilos na noite, o som que fazem de felizes com a noite de verão.
O som que fazem se encaixa no ritmo da música e ambos se misturam, se entrelaçam. Me fazem sorrir.
Fico com vontade de fazer algum som com meu corpo, pra que eu possa entrelaçar meus braços e pernas deles também.
Quero fazer parte desse canto.
Então escrevo com compasso e movimento – sem esforço - e meus pensamentos são curvos e extensos. Meu corpo respira e se estica. Danço a formação das palavras.
A noite é de verão e estou sozinha.
Lá fora, uma brisa morna. Às vezes faz curvas pra se encontrar com meus pensamentos e toca meu corpo como que dizendo: “Eu sei...”
Arrepia os pêlos do meu corpo.
Aprendo aos poucos a sentir minha fragilidade. Meus olhos suaves como a brisa, como a música.
Nós três unidas, nessa noite de verão.


20/12/2006

Tuesday, December 12, 2006

Dois diálogos

Fragmentos perdidos de um diálogo qualquer (que de qualquer não tem nada), mas que acabou:


“Sinto-me tão acolhido por ti que sou capaz de dormir”

“Motivada pela doçura de suas palavras, mas também pelo seu crédito em meus empreendimentos, não posso deixar de dizer que seus cílios me encantam”. Sinto-me compelida a acreditar que eles estão aí para (me?) seduzir, mas confesso que fico confusa entre as idéias de sedução ou feitiço...”


“Informo-te que fiquei surpreso com teus dizeres em relação aos meus cílios. A meu ver, apenas uma mulher com o grau de sensibilidade como o teu, seria capaz de atribuir valor a algo tão singelo como os pequenos pêlos que crescem nas extremidades das pálpebras e que possuem a importante função de evitar que partículas sólidas suspensas no ar entrem em contato com os olhos.”
... sedução, sinto em discordar na sua utilização. Sedução, a meu ver, envolve certo grau de dominação, característica ligada às pulsões sádicas. O termo que eu utilizaria seria conquista...”

“Em relação à sedução, tenho uma pergunta: juras, que em suas conquistas, não há sempre um pingo de sedução? Se não houver, quando amamos devemos deixar o amado livre?”


“Granjear é cultivar (a terra). É nesse sentido que utilizo a palavra conquistar! O granjeador não está preso a sua plantação. Ele faz isso por que lhe traz satisfação! E o melhor: ele pode vivenciar a gratidão em relação a sua terra quando, após um período de dedicação, ela lhe traz belos frutos. Isso aumenta a interação entre os dois e me leva a fantasiar que a terra também o ama.”
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Considerações, romance e utopia.

“Difícil aceitar a igualdade. Difícil perceber que o que se quer pra si, deve ser permitido ao outro. Que o afago recebido deve ser proporcional ao que se dá. Assim como o silêncio ou a distância.”

“Porque toda estória de amor se escreve com, no mínimo, dois personagens. São dois mundos que se cruzam, são dois universos em constante expansão. Milhões de moléculas se quebrando, se rompendo, se comprimindo, morrendo, expandindo, nascendo. Tudo ao mesmo tempo. Somos, naturalmente, um buraco negro de confusão existencial.”

“Ele tem os próprios acentos e vírgulas e possibilidades de frasear o mesmo parágrafo.”
”O que somos obrigados a fazer é cultivar o respeito ao próprio coração.”

“Se sou eu a representante da palavra SEDUÇÃO nesta história, como pude deixá-lo livre? E ele, sendo o representante da palavra conquista como pôde querer me dominar?... Incoerentes estas idéias deste povo monogâmico, não?”

“Mas aí a gente tem que transcender essas idéias tolas porque isso é ego. Pra mim é puro ego.”

“Entenda ou não, saiba ou não, enxergue ou não, aqui dentro tem um coração poderoso e brilhante que pulsa, pulsa por aí tentando se encontrar. E um dia, natural e tranquilamente, um olhar vai se cruzar com outro. E tudo vai se entender sozinho. Ahhhh... o que seria da minha vida se não fosse romanceada?”


“Bingo! É isso que eu queria que ele entendesse. Sabe, talvez numa próxima encarnação, poderiamos nos encontrar?! Melhor ainda se não tivessemos egos!... mas aí nasceríamos como fada e "fado", por que somente estes seres fantásticos, se é que eles existem, não o teriam - este maldito.”

Ah! E nossa vida, bendita seja, será sempre romanceada! Ainda bem que vc existe na minha vida amiga, senão estaria perdida, no meio de dragões, carruagens e castelos que (olhe a sua volta!) quase ninguem está vendo!

eu amo minha mãe

eu amo minha mãe.

ela fala: "deus te abençoe e te guarde, minha filha"

(o que ela ainda não sabe é que Deus sou Eu)

O nascimento do prazer

O prazer nascendo dói tanto no peito que se prefere sentir a habituada dor ao insólito prazer. A alegria verdadeira não tem explicação possível, não tem a possibilidade de ser compreendida - e se parece com o início de uma perdição irrecuperável. Esse fundir-se total é insuportavelmente bom - como se a morte fosse o nosso bem maior e final, só que não é a morte, é a vida incomensurável que chega a se parecer com a grandeza da morte. Deve-se deixar inundar pela alegria aos poucos - pois é a vida nascendo. E quem não tiver força, que antes cubra cada nervo com uma película protetora, com uma película de morte para poder tolerar a vida. Essa película pode consistir em qualquer ato formal protetor, em qualquer silêncio ou em várias palavras sem sentido. Pois o prazer não é de se brincar com ele. Ele é nós.